Lameblogadas

segunda-feira, dezembro 08, 2003




Saí do Rio no domingo com o coração apertado. Tinha deixado para trás a dor de uma amiga muito amada, que perdeu o seu companheiro de uma vida. Um pai que ela insistia em chamar pelo nome, Joaquim, e do qual vivia a exaltar as qualidades. Entre elas, a de um bom cozinheiro. Prometeu, prometeu, mas não marcou o tal almoço no Engenho do Mato, com bobó de camarão, a especialidade dele. Na sexta-feira, me confessou: "tinha medo que vocês não gostassem".
Como nem tudo que ela fala se escreve, e eu já aprendi a ler sua verdade nas entrelinhas, tenho certeza de que o prato só poderia ser uma delícia. Joana é assim: demoramos muito a saber que seu pai foi um dos fundadores do PT em Niterói. Se o Lula não tivesse ganhado a eleição ano passado, o que a motivou a escrever um texto muito bonito, nós só ficaríamos sabendo na última sexta-feira que a sua casa foi a primeira sede improvisada do partido na cidade.
Não convivi com ele. Só tive o prazer de conhecê-lo há poucos meses, na festa de aniversário da pessoinha que mais alegrava sua existência no último ano: a neta Ana Luísa. Mas no convívio com a minha amiga, percebo as marcas que o pai deixou nela: a principal é a capacidade de se indignar com as injustiças do mundo e a generosidade. E assim é Joana: uma pessoa que não fala muito de amor, mas o pratica em cada ato. Os muitos amigos que tem (carente que é, sempre diz que tem poucos) sabem disso.
Ah, entre outras coisas, Joaquim fez da Joana uma menina muito mimada. E muito inteligente também. Ele andava muito contente com a cantora Maria Rita. Fã de Elis, dizia que sua filha ajudava-o a matar a saudade que tinha da mãe. Em homenagem a ele, posto uma música da mãe, que nos faz lembrar de outro petista que honrou a estrela do partido.

Caía a tarde feito um viaduto
E um bêbado trajando luto me lembrou Carlitos
A lua, tal qual a dona de um bordel
Pedia a cada estrela fria
Um brilho de aluguel
E nuvens, lá no mata-borrão do céu
Chupavam manchas torturadas, que sufoco
Louco, o bêbado com chapéu-coco
Fazia irreverências mil pra noite do Brasil
Meu Brasil
Que sonha com a volta do irmão do Henfil
Com tanta gente que partiu num rabo de foguete
Chora a nossa pátria, mãe gentil
Choram Marias e Clarices no solo do Brasil
Mas sei que uma dor assim pungente
Não há de ser inutilmente, a esperança
Dança na corda bamba de sombrinha
E em cada passo dessa linha pode se machucar
Azar, a esperança equilibrista
Sabe que o show de todo artista
Tem que continuar...