Lameblogadas

terça-feira, junho 22, 2004



A última das suas foi ter sido uma das fontes da polêmica reportagem de Larry Rohter no New York Times - aquela que insinuava ser Lula um presidente inepto por causa da bebida que tomava em quantidades preocupantes para o povo brasileiro. Entre outras, pregou no mesmo Lula o apelido de "sapo barbudo" - que serviu como uma luva aos adversários em 1989. Preferiu, na última campanha à presidência, apoiar a candidatura de Ciro Gomes, em vez de se aliar ao petista que ganharia a eleição e passaria a ser seu alvo predileto de críticas. No mesmo pleito, decidiu se candidatar ao Senado e sofreu uma das piores derrotas de sua carreira, ficando atrás de gente como os pastores Marcelo Crivella e Manoel Ferreira (o que aconteceu com o Rio?)
Num bate-papo informal no aeroporto de Angra dos Reis, na campanha de 2002, Lula me disse que Brizola estava para a política como Romário para o futebol. O futuro presidente achava que estava na hora do herói da campanha pela legalidade, que garantiu a posse de João Goulart no longínquo 1961, se aposentar. Chegara a vez do sapo barbudo reinar soberano na pátria de chuteiras.
Mas ele continuou ativo - ainda que sem muita influência - à frente do seu PDT, e era ouvido pelos adversários. A governadora do Rio não hesitou em procurá-lo (coerência e passado são duas palavras com significados diferentes no mundo da política) para negociar apoio na sucessão municipal da cidade. Até o PSDB de Fernando Henrique e José Serra, do qual Brizola foi ferrenho crítico (quem não era, na sua verve de metralhadora?), o procurou no auge da crise Waldomiro Diniz.
O homem que criou o Sambódromo e os Cieps, ao lado de um grande brasileiro chamado Darcy Ribeiro, vai deixar saudades. Com todas as idiossincracias, ele foi um dos nossos maiores políticos. Suas campanhas no Rio de Janeiro foram o último sopro daquela política que atrai o povo para a rua espontaneamente, sem promessas de vale-lanches ou cheque-cidadão. Não tive tempo para acompanhar nada disso, mas ouvi relatos emocionados daquela época - de políticos até colegas da imprensa que haviam sido "brizolistas".
Odiado e amado, Brizola ainda causa comoção. Sua morte, aos 82 anos, fez muita gente chorar ontem. Para quem gosta de política ou simplesmente acompanha a história do nosso Brasil, ele vai fazer falta. Ficará na memória como um símbolo de resistência à ditadura, aos militares e ao imperialismo. Um homem como poucos.


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Em março, o plantão na porta do seu apartamento na Av. Atlântica (foram muitos debaixo de sol e chuva) rendeu a última matéria que fiz com ele. Nesse dia, acompanhado dos tucanos José Serra e Artur Virgílio, ele estava mais prolixo que nunca, falando bastante sobre o golpe de 64 e a trajetória do trabalhismo no Brasil. Eis o texto, publicado em 16.03.2004, véspera do meu aniversário:

Serra e Brizola se juntam para cobrar CPI

Tucano pede apuração rigorosa e pedetista diz que Lula frustrou expectativas

Cláudia Lamego

Quarenta anos depois de dividirem o mesmo palanque e lutarem juntos contra a ditadura, o tucano José Serra e o pedetista Leonel Brizola voltaram a se unir em torno de um objetivo político. Os presidentes do PSDB e do PDT, acompanhados do líder tucano no Senado, Arthur Virgílio (AM), encontraram-se ontem, no Rio, para cobrar do governo a investigação profunda do caso Waldomiro Diniz.

Virgílio afirmou que vai insistir na criação de uma CPI para o caso Waldomiro e que não vê mais necessidade da saída do chefe da Casa Civil, José Dirceu, do governo.

- Dizem que Waldomiro era honesto até 2002. Quero acreditar que ele sempre foi desonesto e descobrir a quem ele servia. Temos que investigar as relações entre o ex-assessor, a Gtech, a Caixa Econômica, o advogado Buratti e o bicheiro Carlinhos Cachoeira. Temos que saber quem no Palácio do Planalto tem relações com a aliança entre essas pessoas e instituições. Se o governo acha que esse conluio não deve ser investigado, está no mundo da lua- disse Virgílio.

Serra também defendeu uma investigação ampla e reclamou da resistência do PT à criação da CPI.

- Muita coisa ainda não foi feita, muitos passos não foram dados. Daí acaba se impondo um outro tipo de investigação, sem obstrução - disse Serra.

Os tucanos disseram que procuraram Brizola pelo que o pedetista representa como patrimônio ético. Serra lembrou que eles estiveram juntos no comício da Central do Brasil, em 1964, e lutaram contra a ditadura.

- Há mais de 40 anos temos uma relação pessoal com Brizola, desde que eu era líder estudantil e ele, deputado pela Guanabara.

Brizola lembrou do exílio e disse compartilhar com Serra e o PSDB as críticas ao governo.

- Fomos exilados e lutamos juntos contra a ditadura. É natural que conversemos sobre a situação atual, em que temos um governo fraco e que frustrou nossas expectativas.

Virgílio disse que os dois partidos atuam juntos no Senado.

- Lá, o governo tem maioria, mas não consegue usar o rolo compressor contra as investigações.