Lameblogadas

sexta-feira, dezembro 15, 2006

A Ouvidor do meu tempo

Eu adoro frases de efeito. Talvez influenciada pelo meu ídolo Nelson Rodrigues, passei a cultivar um personagem que gosta de inventar situações, de criar polêmicas e dizer palavras que causem choque nos interlocutores. (É preciso dizer que poucas pessoas têm acesso a essa Cláudia ficcional e meu amor é uma delas).

Mas hoje quero revelar um dos meus bordões prediletos: "Só leio os clássicos, não tenho tempo para os contemporâneos, nem para os já consagrados". Em parte, ele se explica pelo grande hiato entre a vida sem-livros e com-eles. Não ter lido Monteiro Lobato na infância é um grande complexo. Não ter tido jamais uma estante em casa com todo o Machado de Assis, só para citar um dos grandes, me dá uma sensação de perda jamais recuperável (vem daí a minha compulsão por comprar vários livros de uma vez, mesmo sabendo que não darei conta de ler todos até a próxima ida à livraria).

Desde que comecei a ler, portanto, puxo angústia pensando que o tempo é escasso para a minha demanda literária (lembro sempre de João Cabral dizendo que esperava a aposentadoria para ler mais e, no entanto, ficou cego depois que o grande momento de sua vida chegou!!!). Outra fonte de ansiedade é a hora da escolha. Depois de uma certa idade, a gente passa a vida decidindo prioridades. "Vou ao cinema ver o Truffaut de graça ou visito minha amiga que acabou de ter um bebê?" "Começo a ler a biografia da Carmem Miranda, para relembrar de como gosto desse gênero, abandonado nos últimos meses, ou o livro sobre maio de 68, outro assunto que me fascina?" "Sofro porque escolhi comprar o DVD com os curtas de Fernando Sabino e David Neves, preterindo o livro que conta a história da José Olympio, ou aproveito para relaxar o curto tempo de folga no passeio à Livraria da Travessa?"

Neste último caso, fiquei com a segunda opção. E na hora me dei conta de que a Travessa pode ser comparada, por que não?, à José Olympio de outrora. Falei isso com o Carlinhos, e conversamos sobre o crescimento da livraria, a tentativa do lugar de se manter aconchegante, da necessidade dos atendentes saberem de que livro estamos falando, etc. Afirmei a importância também de valorizarmos o nosso presente, em vez de só lamentar por não ter esbarrado com o Drummond nos pilotis do MEC (ora bolas, já esbarrei lá com o Jabor e, freqüentemente, encontro o meu amor!), com o Bandeira nas ruas da Lapa, com o Paulo Mendes Campos no Vilarino...

Eu entrara na Travessa para relaxar, depois de um dia estressante nos corredores do Fórum (assunto que merece outro post), porque sei que ali sempre encontrarei um amigo. E o Carlinhos, amigo-funcionário sempre atento, percebeu que estava tensa. E me deu mais tempo de prosa que o de costume. No papo sobre as livrarias, ele citou o amigo Rodrigo Ferrari, lembrando que a Folha Seca vai fazer três anos. De se comemorar!!!

(lembro a primeira vez que encontrei o Carlinhos na Folha Seca. Ele estava lá para um lançamento e, ao me ver, foi logo se explicando: "não somos concorrentes, somos amigos. e quanto mais livrarias, melhor." Eu sempre quis trabalhar na Travessa, mas nunca tive coragem de pedir e largar o jornal para isso)

Como estava com essa ... a minha amiga Gi chamaria de "energia de pensamento", ao chegar no trabalho, abri o email e tinha lá a indicação do amigo Henrique Rodrigues (um poeta do meu tempo!) para uma entrevista com ele, o Marcelo Moutinho (sabe meu nome!) e a Ana Beatriz Guerra no Portal Literal (http://portalliteral.terra.com.br/ a propósito do vôo solo dos três _ que participaram recentemente de uma antologia de contos organizada pelo segundo _ na literatura.

Na entrevista, muito boa, eles contam como foi o primeiro contato com o mundo do fazer literário, assumem, e como é bom ler isso, que escrevem para serem lidos mesmo, revelam que uma estratégia para conseguirem publicar era o caminho do coletivo, comentam a força da internet nessa troca de experiências fantástica que são os blogs (eu mesma os conheci pela rede) e chamam a atenção para a pluralidade, quantidade e qualidade da nova produção aliada ao desafio de encontrar novos leitores. Tocou na minha ferida!

Saber dosar o tempo entre o passado e o presente é das minhas grandes fontes de angústia, como dito lá em cima. E como fiquei feliz ao ler o novo livro dos dois (aqui preciso dizer que não conheço a Ana Beatriz, sendo minhas referências, por enquanto, restritas a eles mesmo), fincando os dois pés no presente, sem sofrer porque não li inteiro todo o Proust comprado na Travessa num dos ataques de depressão pós-descoberta do fantástico mundo da literatura. Mas confesso que li porque é uma sorte tê-los como amigos. Porque as obras são muito boas e aqui nem cabe meus elogios - me constrange não saber fazer crítica literária, mesmo sabendo que a crítica sentimental também pode produzir belos e consistentes textos.

(e eu prometi escrever ao Moutinho sobre o livro dele. outra escolha hoje: mandar um email a ele sobre tudo isso ou fazer o post? tomara que ele não demore a me visitar)

Vou tentar aproveitar o início de madrugada insone para acelerar a leitura de "O prazer dos olhos", de Truffaut, que está chegando ao fim. A fila cada vez cresce mais. E eu vou me equilibrando.

domingo, dezembro 10, 2006




Tia Clau e Antônio, no aniversário da tia Dê.

Dúvida: existe coisa melhor que beijo e carinho de criança?

Foto: La Tercera Digital














Chilenos comemoram na Praça Itália a morte do ditador Augusto Pinochet.

Em espírito, me junto à manifestação e choro pelos que morreram e por aqueles que ficaram, mas nunca viram a cor da justiça.

Que seu nome seja para sempre associado ao sangue e à dor dos que foram derrubados pela sua tirania. Essa é a derrota possível a ser imposta pela História.

O resto é a democracia. Viva ela!