Lameblogadas

quinta-feira, junho 03, 2004



"(...) Sim, sim! o Tempo reapareceu; o Tempo agora reina soberano; e vem com o hediondo velho seu demoníaco cortejo de Lembranças, Penas, Espasmos, Paúras, Angústias, Pesadelos, Cóleras, Neuroses.
Posso garantir que os segundos são agora forte e solenemente acentuados e cada um, jorrando do relógio, diz: "Eu sou a Vida, a insuportável, a implacável Vida!".
Só um Segundo na vida humana tem a missão de anunciar uma boa nova, a boa nova que causa em todos nós um medo inexplicável.
Sim! o Tempo reina; retomou sua ditadura brutal. E me empurra, como um boi, com seu duplo aguilhão - "Upa!, burro! Sua, escravo! Vive, amaldiçoado!" (Charles Baudelaire, "O quarto de casal", em "O Spleen de Paris")



Água de beber

A citação de Custódio Mesquita e do Ernesto Nazareth no belo show do Quarteto Maogani, ontem, no Municipal de Niterói, me fizeram acordar com a música abaixo na cabeça. É a minha preferida no CD "Sambistas de fato", da Aracy de Almeida e Ciro Monteiro. Essa faixa é cantada pela Dama do Encantado.


Flauta, cavaquinho e violão(Custódio Mesquita e Orestes Barbosa)

Se existe alguém aí pela cidade
com saudade
do Rio iluminado a lampião
será para esse alguém este passado
renovado
com flauta, cavaquinho e violão

E quem não conheceu o Rio antigo
tão amigo
de festas e serestas ao luar
ouvindo este harpejar de antigamente
certamente
contente deste choro há de gostar

No Rio dos sonetos de Bilac
só de fraque
é que se freqüentava o cabaré
Havia para as grandes confissões
dos corações
os tangos do Ernesto Nazaré

Os rapazes usavam flor no peito
e havia um jeito
de falar de amor de mão em mão
Nos leques onde sem assinatura
os sem-ventura
deixavam soluçando um coração

quarta-feira, junho 02, 2004



À poeta que se foi

Murilograma a João Cabral de Melo Neto

(...)

2

Sim: não é fácil chamar-se
João Cabral de Melo Neto

Força é ser engenheiro
Mesmo sem curso & diploma.
Pernambucano espanhol
Vendo a vida sem dissímulo;

Construir linguagem enxuta
Mantendo-a na precisão,
Articular a poesia
Em densa forma de quatro,
Em ritmos de ordem serial;
Aderir ao próprio texto
Com o corpo, escrever com o
Corpo;
Exato que nem uma faca.

Força é abolir o abstrato,
Encarnar pessoa física,
Apreender coisa real,
Planificar o finito;

Conhecer o vivo do homem
Até o mais fundo do osso,
Desde o nove de um Mondrian
Até o zero dum cassaco
Espremido pelos homens
Na sua negra engrenagem;
Radiografar a miséria
Consentida, estimulada
Pelos donos da direita,
Levantar-se contra a fome
Sem retórica gestual;

Descobrir o ovo, a raiz,
o núcleo, o germe do objeto;

Ter linguagem contundente,
"A palo seco"; e portar
- Sem nenhum superlativo -
Olho e mão superlativos
Com o suplente microscópio.



Duas figuras, Ismael Nery

Duas coisas me levaram a reler Murilo hoje: a visita revelada do amigo Sidney ao blog e o quase-encontro com a poeta que se foi...

Metade pássaro(Murilo Mendes)

A mulher do fim do mundo
Dá de comer às roseiras,
Dá de beber às estátuas,
Dá de sonhar aos poetas.

A mulher do fim do mundo
Chama a luz com um assobio.
Faz a virgem virar pedra,
Cura a tempestade,
Desvia o curso dos sonhos.
Escreve cartas ao rio,
Me puxa do sono eterno
Para os seus braços que cantam.

terça-feira, junho 01, 2004




Zé Renato estréia amanhã show no Centro Cultural Carioca baseado em repertório de Orlando Silva. Abaixo, uma das músicas de que mais gosto do cantor das multidões.
Canção marcada na minha alma com a voz de um outro cantor, que se apresenta quinzenalmente no Carioca da Gema, na Lapa. Um que tem os olhos verdes, cor de baunilha (hummm) e (sem) jeito de Chico no palco...

Curare (Bororó)

Você tem boniteza
e a natureza foi quem agiu
Com esses olhos de índia
curare no corpo que é bem Brasil
Você é toda a Bahia,
é a flor no campo da gente de cor
Faz do amor confusão
Numa misturação bem banzeira
Inzoneira, que tem raça e tradição
Que é pra machucar minha dor
Nega, neguinha, tudo, tudinho
Meu amorzinho
com essa boquinha vermelhinha
Que rasgadinha tem veneno como quê
Conta tristeza e alegria pro seu bem
Que vive a dizer
Que você é diferente
de toda essa gente que finge querer



O mês é dele!


A Rosa (Chico Buarque)

Arrasa o meu projeto de vida
Querida, estrela do meu caminho
Espinho cravado em minha garganta
Garganta
A santa às vezes troca meu nome
E some

E some nas altas da madrugada
Coitada, trabalha de plantonista
Artista, é doida pela Portela
Ói ela
Ói ela, vestida de verde e rosa

A Rosa garante que é sempre minha
Quietinha, saiu pra comprar cigarro
Que sarro, trouxe umas coisas do Norte
Que sorte
Que sorte, voltou toda sorridente

Demente, inventa cada carícia
Egípcia, me encontra e me vira a cara
Odara, gravou meu nome na blusa
Abusa, me acusa
Revista os bolsos da calça

A falsa limpou a minha carteira
Maneira, pagou a nossa despesa
Beleza, na hora do bom me deixa, se queixa
A gueixa
Que coisa mais amorosa
A Rosa

Ah, Rosa, e o meu projeto de vida?
Bandida, cadê minha estrela guia
Vadia, me esquece na noite escura
Mas jura
Me jura que um dia volta pra casa

Arrasa o meu projeto de vida
Querida, estrela do meu caminho
Espinho cravado em minha garganta
Garganta
A santa às vezes me chama Alberto
Alberto

Decerto sonhou com alguma novela
Penélope, espera por mim bordando
Suando, ficou de cama com febre
Que febre
A lebre, como é que ela é tão fogosa
A Rosa

A Rosa jurou seu amor eterno
Meu terno ficou na tinturaria
Um dia me trouxe uma roupa justa
Me gusta, me gusta
Cismou de dançar um tango

Meu rango sumiu lá da geladeira
Caseira, seu molho é uma maravilha
Que filha, visita a família em Sampa
Às pampa, às pampa
Voltou toda descascada

A fada, acaba com a minha lira
A gira, esgota a minha laringe
Esfinge, devora a minha pessoa
À toa, a boa
Que coisa mais saborosa
A Rosa

Ah, Rosa, e o meu projeto de vida?
Bandida, cadê minha estrela guia?
Vadia, me esquece na noite escura
Mas jura
Me jura que um dia volta pra casa


segunda-feira, maio 31, 2004



Despedida

Saio do Zona Norte sem ter conhecido a Feira de São Cristóvão e, pior, feito uma matéria com a minha querida Portela. Logo nessa semana, em que a escola definiu o enredo sobre a ONU, que trará projetos sociais e patrocínio a Oswaldo Cruz... Se o que a escola está divulgando for mesmo verdade, acho que é o primeiro passo para ela voltar ao grupo dos grandes. Ano que vem, chova ou faça sol, estarei na Sapucaí prestigiando minha azul-e-branca querida!

Como ia dizendo, estou trocando mais uma vez de caderno. Dessa vez, antes de voltar para o Zona Oeste, farei um pit stop de uma semana no Zona Sul. Assim, terei trabalhado em quatro cadernos diferentes até a metade do ano. Isso é que é rotatividade! Que a campanha eleitoral venha logo!!!



A cada poesia, um romance...

Feliz de quem sabe encontrar a paz na literatura. Nos meus momentos de solidão e convalescença, aproveito para pôr em dia a leitura dos clássicos. Desses dias tristes, trago na lembrança boas leituras de Proust, Dostoievski, Poe, Eça, Nelson Rodrigues... e assim vou tentando driblar com inteligência uma doença que não mata, mas fere e me deixa debilitada.



Mais do mesmo

Esgotou-se a minha paciência com a Fórmula-1. Não suporto mais ouvir os cálculos do Galvão e do Reginaldo Leme sobre a quantidade de gasolina dos carros. A vitória é decidida agora nos boxes, dependendendo mais da estratégia do número de paradas para reabastecimento que da disputa nas pistas. Que graça isso tem?
Depois de um fim-de-semana fantástico em Mônaco, com direito a batidas, ultrapassagens e até a um erro do Schumy (coisa raríssima de se ver), o circo volta ao normal no GP da Europa. Eu voltei a dormir durante a corrida. Acordar cedo para que? Apreciar o belo circuito da Alemanha? Não dá.

Nota: Que entrevista foi aquela do Rubinho, no dia do seu aniversário, dizendo - como um bobo que é - que já tinha pedido ao Schumacher para deixá-lo ganhar, como presente? E a imprensa que destacou o terceiro lugar dele como um prêmio? Ah, nunca torci tanto para ele ser dispensado logo da Ferrari. Ficaríamos livres dessa vergonha!!



De volta ao batente e ao blog, depois de uma semana derrubada por uma poesia do Bandeira.
Amigos, saudade!