Lameblogadas

sexta-feira, julho 14, 2006

Felicidade dura pouco...

A violência em São Paulo me trouxe de volta ao fechamento. Campanha estadual? Ficou para a próxima semana, se o PCC deixar espaço...

O relógio da Central marca 22h30. A fumaça do churrasquinho atravessa a rua. Ela, que agora aprendeu a andar de van, torce para pegar um transporte alternativo até sua cama. Enquanto o ônibus não vem, tenta antecipar os sonhos da madrugada. E levita, com os pés no chão, tentando encontrar um novo caminho para justificar seu passeio pelo mundo. Já quis morar numa biblioteca, no sótão de um castelo inglês do século XVIII. Hoje, se contentaria se pudesse viver numa casa com quintal e árvores e tivesse tempo livre para buscar o casal de gêmeos na escola. A moça, que sempre preferiu o odor dos desinfetantes que deixavam o chão de sua casa brilhante, agora só quer sentir o cheiro dos temperos - embora não saiba cozinhar mais que uma boa omelete com restos de frios. Para onde vai essa mulher? Com medo de voar, finca os pés no chão. E chora.

quarta-feira, julho 12, 2006

Antônio na última roda de samba do sítio do tio Pepê, em Friburgo



O Antônio é um amigo que sempre nos acompanha nas festas, nos bares, nas viagens, nos eventos do Caroço. É a paixão de um grupo que já virou uma família, que o tem também como filho. Daqui a duas semanas, ele faz aniversário e iria ganhar um post na ocasião. Mas hoje, ao ler o texto abaixo do Paulo Roberto Pires, me lembrei dele e posto aqui em homenagem ao pequeno amigo.

A criança de botequim *

É impressionante a solidão da criança de botequim. Esta sensação, aguda, me veio na festa que comemorou, mês passado, os 50 anos do encontro de Vinicius de Moraes e Tom Jobim. Como se sabe, o poeta, já consagrado, e o músico iniciante foram apresentados um ao outro por Lucio Rangel, discreto super-herói da música brasileira, numa mesa da uisqueria Villariño, que continua de pé no Centro do Rio de Janeiro, alegremente habitada por seus fantasmas camaradas.

No fundo do bar, há a reprodução, que ocupa toda uma parede, da famosa fotografia de uma mesa dos anos 50, tirada naquela exata posição no Villariño. Nela estão Vinicius, Lúcio, Paulo Mendes Campos, Fernando Lobo, José Condé, Sérgio Porto (de costas), um sujeito de óculos que jamais foi reconhecido e, solitariamente, encarando a câmera, uma criança. É Pedro de Moraes, filho do poeta e hoje fotógrafo de primeira, que na época devia ter uns 10 anos e, na foto, parece perdido entre baldinhos de gelo, copos longos, garrafas de uísque e boêmios históricos.

Se eu fosse francês e semiólogo como Roland Barthes, diria que aquela foto tem um studium, que é seu contexto histórico, que determina sua importância e faz com que a gente fale dela até hoje, e um punctum , que é o ponto de fuga, o detalhe que rouba a atenção e nos leva para além de todo o contexto, às vezes até anulando-o. Como sou carioca e estou mais para Escola de Samba do que Collège de France, diria que ser criança de botequim não é mole não.

Pois a criança de botequim não conhece geração, época ou lugar. É filho ou filha de boêmio e, em idade tida como imprópria e hora havida como incorreta, acaba freqüentando com o pai (ou a mãe) um meio em que adultos bebem, conversam, riem, namoram, contam histórias, casam, descasam, comemoram, lamentam. Um mundo que se abre diante de uma criança entre perplexa e entediada, a quem procuram agradar com revistas, lápis de cor e balas. E que finge entreter-se, destinando aos adultos a sábia condescendência infantil.

Quem traz o botequim na lembrança como uma bicicleta ou um álbum de figurinhas sabe do que estou falando. Mas os que não têm esta referência que não se apressem em identificar nela um trauma infantil ou pesadelo similar: a criança de botequim é, na verdade, cumulada de afeto, do afeto possível do pai ou da mãe que, não resistindo aos apelos do desregramento boêmio, precisam manter um vínculo com a vida dos calendários e relógios.

Pois boêmio que é boêmio sempre vive no dilema entre a casa e a rua, uma das muitas formas, aliás, de perceber a luz e a sombra da existência, a ordem e desordem dos sentidos, o dia cheio de exigências e a noite aberta em liberdade. Esta é uma vida um tanto turvada e, no fundo, solitária – quando se volta para a família um pouco alterado, quando a manhã arromba todas as ilusões e os carros passam com os faróis ainda acesos com a barulhada de pardais.

A criança de botequim é uma doce garantia de que nada disso vai acontecer. Ela, por ser criança, inibe a madrugada jogada fora, a errância do desejo de quem quer tudo ao mesmo tempo, a tal da solidão do boêmio. Na intimidade do boêmio, ela é a companhia essencial, o esteio.

Filha de um ilustre boêmio, uma ex-criança de botequim me contou que, aos 15 anos, acompanhou o pai a um bar, à espera de conhecer um de seus célebres amigos músicos. Para seu espanto, o pai pediu dois uísques. "Eu não bebo, pai", argumentou. "Mas eu não gosto de beber sozinho", respondeu ele, iniciando-a, assim, numa vida boêmia própria. Uma outra ex-criança de botequim, também filha de pai ilustre, acabou fazendo da própria filha sua companhia, ao ponto em que a criança dizia, sem problemas: "Minha mãe trabalha em tal lugar (o escritório de verdade) e no (o bar em questão)".

Politicamente corretos de todas as extrações e níveis de paranóia podem ver nisso tudo uma denúncia terrível de como o álcool desestrutura famílias, pode ser passado de geração em geração, é danoso para as relações humanas, etc. É, pode ser. Mas o principal para entender a criança de botequim não é a dissolução, mas a união.

Pois se a criança, quando no botequim, vive a solidão, pouco tempo depois acaba assimilando alguns valores nada desprezíveis. Sabe, desde cedo, que a vida só é rica com o encontro, com a troca, com a conversa, com a disponibilidade. Descobre que o "fazer nada" do papo furado é, quase sempre, um "fazer tudo", exercício de inteligência. Experimenta como a amizade, de botequim ou não, é um antídoto contra a cretinice da vida. Lembra, para sempre, do pai ou da mãe como um amigo próximo, com quem a qualquer momento você pode sentar e trocar idéias de igual para igual, como sempre os viu fazer com os outros.

É impressionante a solidão da criança de botequim. Mas, com a distância do tempo, ela é um afago na alma se comparada à solidão que nos espreita a todos quando morre, em nós, aquela criança que, entre perplexa e entediada, era movida a curiosidade pelo mundo que descobria.

* Este post também é para a Clara, que estará entre os amigos da mamãe Juli e do papai Carlos nos bares da vida.

segunda-feira, julho 10, 2006

Foto de Márcia Foletto


Gastronomia de campanha

Entre um evento e outro, a equipe que foi cobrir hoje o Eduardo Paes em Copacabana lembrou de mim ao entrar numa padaria e descobrir a rosca com meu nome. Não é fofo?



Depois de passar pelo Buraco do Lume, dediquei meu dia hoje a uma matéria que seria dominical, passou para o dia, tornou-se especial, ou seja, sem data para sair.

Mas antes estive no Buraco do Lume para cobrir a agenda do Vladimir Palmeira. Quem um dia teve alguma esperança de que o PT do Rio poderia se recuperar do baque de 1998 (quando Dirceu e cia. intervieram no diretório estadual e obrigaram o partido a se aliar a Garotinho), é triste ver a campanha do líder estudantil de 1968 e ainda amigo de Dirceu ali. Em volta, além do deputado Alessandro Molon, o único petista mais ou menos conhecido, apenas os candidatos, seus assessores e familiares. E parte da imprensa.

Patético.



Santo forte!

Na sexta-feira, eu já estava voltando para a redação quando vi alguém com um colete do TRE no meio dos carros e ônibus de uma rua adjacente ao Saara. Estava lá cobrindo o corpo-a-corpo do ex-pupilo-clone de Cesar Maia, Eduardo Paes. Os fiscais do TRE foram atrás de uma irregularidade: nessa campanha é proibido usar camisetas com o nome dos candidatos, distribuir brindes (os candidatos adoravam dar chaveirinhos, camisas, bonés, batons e até lixas para os eleitores), fazer showmícios, etc. É tanta proibição que até o TRE tem dúvidas sobre o que será permitido ou não.

Enquanto os fiscais do TRE se preparavam para ir embora, os assessores de Paes denunciaram um caminhão da Jandira Feghali que passava pela Presidente Vargas, que trazia uma propaganda fora das medidas da candidata ao Senado pelo PCdoB. No que o chefe da patrulha do TRE correu, perguntou para onde ia o caminhão e chamou sua trupe para o carro. Mas não conseguiram partir: o gol do TRE estava com o pneu furado.

"Que santo forte tem essa comunista", disse ele, frustrado, enquanto os outros dois trocavam o pneu...