Lameblogadas

sexta-feira, janeiro 09, 2004




Acordo com um telefonema às 7h. Achei que ela já estivesse no Brasil tão nítida era a sua voz. Não, ela queria apenas combinar o café da manhã de domingo, quando chega da Alemanha. Ah, precisava saber também quais os cremes que eu gostaria de ganhar.
A minha amiga Gislaine, que está morando há mais de um ano na terra de Goethe, é daquelas que sabem absolutamente de tudo que acontece em nossas vidas. A confidente, a mais próxima da família, quase uma irmã. Para quem a gente liga no sábado à tarde para dar uma volta pelo bairro. Com quem falamos quase todos os dias, aquela que nos acompanha em programas tão diversos como a ida ao salão, ao shopping, ao cinema, ao aniversário do sobrinho e as noitadas. A que nos faz chorar ao ouvir a voz, num simples telefonema. De quem morremos de saudade!!!
Estou muito feliz e já reservei todo o domingo para ela.



Meu amor e respeito pela Mangueira (sou Portela, obrigatória ressalva) se deve a Cartola, um dos seus mais importantes compositores. Já contei aqui da minha admiração intensa por ele, hoje volto ao assunto para falar da estréia, no CCBB, da peça "Obrigado, Cartola".
Uma amiga aqui do jornal, a Virgínia, que já teve o privilégio de assistir, se derramou em elogios. Só achou meio "over" os figurinos. Vou lá hoje conferir e, além dos atores e do cenário, prestarei muita atenção nos músicos Lucas Porto e Nilze Carvalho. "Ela está linda de verde e rosa, um amor", disse Virgínia.
Uma das músicas de Cartola que mais gosto, e que me faz lembrar do amigo Sidney, que a cantarolava nos dias de labuta na Cajá:

O mundo é um moinho

Ainda é cedo amor, mal começaste a conhecer a vida
Já anuncias a hora de partida
Sem saber mesmo o rumo que irás tomar
Presta atenção, querida
Embora eu saiba que estás resolvida
Em cada esquina cai um pouco a tua vida
E em pouco tempo não serás mais o que és
Ouça-me bem, amor
Preste atenção, o mundo é um moinho
Vai triturar teus sonhos tão mesquinhos
Vai reduzir as ilusões a pó
Preste atenção, querida
De cada amor tu herdarás só o cinismo
Quando notares estás à beira do abismo
Abismo que cavastes com teus pés



Influenciada pelas leituras dos textos de Nelson Rodrigues, no primeiro mês de trabalho na Nacional, d'O Globo, eu cometi a "imprudência" de usar um único e escasso adjetivo num texto que narrava um fato divertido da nossa história. Era a memória sobre o dia em que o prefeito eleito de São Paulo, Jânio Quadros, desinfetou a cadeira onde o seu concorrente derrotado, Fernando Henrique, havia sentado na véspera do pleito.
Pois bem, dia seguinte eu levo um pito do Luiz Garcia no famoso e temido Algumas, email com críticas que ele envia diariamente à redação. Lembro do fato agora lendo uma crônica futebolística do meu querido Nelson. Ele havia de me defender num tribunal por ter abusado do meu direito de querer florear o texto e, por extensão, o fato.
A propósito, reproduzo aqui mais um dos extraordinários textos desse meu escritor preferido. Desculpem, mas só respiro Nelson Rodrigues desde a virada do ano... Esse agora é do livro "A pátria em chuteiras". É mais um dos exageros dramáticos do jornalista que, quando repórter policial, inventava estórias e personagens em suas reportagens.
Não dá para concordar com tudo que ele escreve, mas havemos de ter em mente que o repórter deve se ater à verdade, sim - Nelson exagera - mas procurar nela um lance inusitado, que chame a atenção para algo transcedente ao fato.

O passarinho

Quando o Brasil levantou o Pan-Americano, eu só lamentei uma coisa: - que Bilac não estivesse vivo. Não o Bilac da "Frinéia", do "Nunca morrer assim", das "Virgens mortas", mas sim o Bilac dos tiros de guerra. Infelizmente, não mais existem, nem os tiros, nem o poeta. E é pena. Outrora, cada acontecimento tinha um Homero à mão, ou um Camõs, ou um Dante. Recheado de poesia, entupido de rimas, o fato adquiria uma dimensão nova e emocionante.
Ora, faltou, justamente, à vitória gaúcha, o seu poeta. Os correspondentes brasileiros, que estavam no México, deviam mandar, de lá, telegramas rimados, ungidos de histerismo cívico. Mas como estamos em crise de Bilacs, o fabuloso triunfo só inspirou mesmo uma pífia correspondência, que nos enche de humilhação patriótica e vergonha profissional. Cada cronista da delegação, em vez de babar materialmente de gozo, mandou dizer ao seu jornal o seguinte: - "que os argentinos jogaram mais, que os argentinos mereceram vencer"(...).
Vejam vocês em que dá a mania de justiça e da objetividade! Um cronista apaixonado havia de retocar o fato, transfigurá-lo, dramatizá-lo. Daria à estúpida e chata realidade um sopro de fantasia. Falaria com os arreganhos de um orador canastrão. Em vez disso, os rapazes cingiram-se a uma veracidade pura e abjeta. Ora, o jornalista que tem o culto do fato é profissionalmente um fracassado. Sim, amigos, o fato em si mesmo vale pouco ou nada. O que lhe dá autoridade é o acréscimo da imaginação.
(...) Modelo de eficiência profissional foi aquele repórter que viu um incêndio. (...) O jornalista espia o fogo e conclui que se tratava, na verdade, de um incêndio vagabundo, uma vergonha de incêndio. Qualquer mãe de família o apagaria com um humilhante regador de jardim. Volta o repórter para a redação e, lá, escreve uma página de jornal sobre o fracassado sinistro. E mais: - põe um canário inventado no meio das labaredas, um canário que morre cantando. No dia seguinte, a edição esgotou-se. A cidade inteira, de ponta a ponta, chorou a irreparável perda do bicho.
Vejam vocês a lição de vida e de jornalismo: - com duas mentiras, o repórter alcançara um admirável resultado poético e dramático. O que faltou aos nossos correspondentes do México foi, justamente, o passarinho. Fizemos uma África miserável, uma ilíada tenebrosa, papamos o Chile, o Peru, o México, a Costa Rica e quase a Argentina. E nenhum dos confrades, adidos à delegação, lembrou-se de recriar o canário, de assassiná-lo outra vez. Sem passarinho, não há jornalismo possível.

quinta-feira, janeiro 08, 2004




Ele ia ao Maraca todos os domingos e, reza a lenda, não enxergava nada que acontecia dentro de campo. A falta de visão era compensada pela capacidade infinita de dramatizar estórias a partir de um pequeno detalhe, contado ao pé do ouvido pelo seu acompanhante. O fato, nu e cru, apenas, não o interessava. Certa vez, escreveu sobre o video-tape: "O povo não sabia como conciliar as duas coisas: - o delírio dos locutores e a exata veracidade da imagem. Após a batalha de ontem, eu vi tudo. A verdade está com a imaginação dos locutores. E repito: - a imaginação está sempre muito mais próxima das essências. (...) Disseram os locutores que o Brasil fizera, contra a Inglaterra, uma exibição deslumbrante. Pura imaginação e, por isso mesmo, altamente veraz. O video-tape demonstrou o contrário. Azar da imagem."
Em suas crônicas de futebol, ele inventava personagens como a grã-fina das narinas de cadáver e o Sobrenatural de Almeida; falava de suas obsessões (o amigo e escritor Otto Lara Resende, uma de suas preferidas); transformava anônimos em heróis e objetos, em humanas criaturas. Declarava seu amor pelo Fluminense (não dá para saber em que jogos seu time do coração realmente merecia a vitória como ele escrevia aos leitores) sem o pudor idiota da objetividade. Todos os elementos rodrigueanos de outros textos, como os do romance, das crônicas políticas e até do teatro são encontrados nesses sobre a paixão maior do brasileiro.
A crônica abaixo é do "À sombras das chuteiras imortais", primeira coletânea de crônicas futebolísticas do Nelson. Para o meu amorzinho, que adora esse texto e me deu o livro, já quase devorado:

"Amigos, ontem foi o lírico domingo dos velhos. Aqui, Barbosa, fechando o gol do Vasco; em São Paulo, Jair, decidindo o jogo para o Santos. Duas eternidades e ambas viçosas, ambas salubérrimas. Tanto Jair como Barbosa podiam ser, hoje, o meu personagem da semana. Mas há melhor, amigos, há melhor! Refiro-me ao "Caixa Econômica", a mais recente, inesperada e espetacular celebridade do futebol brasileiro. Antigamente, em matéria de Caixa Econômica, só se conhecia a própria. Mas, graças ao Fla-Flu, fez-se uma descoberta sensacional. Sim, amigos: - existia, aqui, nas nossas barbas, sem que o percebêssemos, o "Caixa Econômica" bandeirinha. Foi a grande e, direi mesmo, foi a contundente surpresa do Fla-Flu!
O bandeirinha! É, na história do futebol, o sujeito mais secundário. A humildade de sua função só tem paralelo com a do gandula. E houve uma época em que o bandeirinha era um franciscano apanhador de bola. Foi preciso que o profissionalismo aparecesse e o arrancasse de sua compacta obscuridade. Então ele subiu social e economicamente. (...) Todavia, nenhum bandeirinha conseguiu, jamais, o furioso destaque do "Caixa Econômica". Num Fla-Flu sensacional, ele conseguiu ofuscar o juiz, os jogadores, o outro bandeirinha. Foi, atrevo-me a dizê-lo, o solista do espetáculo.
Aliás, tudo no "Caixa Econômica" parece predispô-lo para a celebridade e para a glória. A começar pelo apelido. É "Caixa Econômica", como poderia ser "Banco de Crédito Real de Minas Gerais", "Prolar S. A." etc. etc. E vamos e venhamos - ninguém consegue chamar-se "Caixa Econômica" impunemente. Há entre o nome de um sujeito e o seu destino uma conexão inevitável. Napoleão teria que ter um destino napoleônico. E o nosso "Caixa Econômica" não poderia viver eternamente obscuro e eternamente humilde. (...)
Ao começar e até o encerramento da primeira etapa, o "Caixa Econômica" ainda permanecia ignorado, ainda permanecia inédito. E, súbito, na etapa final, surgiu a sua oportunidade napoleônica. Imagino que tenha ocorrido com o nosso herói uma crise de saturação. Cansou-se de ser um fósforo apagado dentro do jogo. Achou talvez abusivo que o campo fosse um espaço privativo dos jogadores e do juiz. E fez o que nenhum outro bandeirinha, jamais, teve o desplante de fazer: - entrou no campo e pôs-se a passear no gramado com uma soberana naturalidade. E, de repente, acontece o inconcebível: - uma tabelinha de um jogador rubro-negro com o "Caixa Econômica"!
Dizem que a bola bateu, simplesmente bateu, no fabuloso bandeirinha. Amigos, sejamos mais líricos e menos objetivos. Vamos admitir que o "Caixa Econômica" deu um passe que caiu como uma luva, ou melhor, uma meia no pé de Henrique. Jamais Zizinho no apogeu, ou Jari, ou divino Domingos da Guia conseguiram ser tão precisos, exatos, perfeitos. O estupor do Fluminense foi de tal ordem que o time parou, de ponta a ponta, e Henrique, vivíssimo, penetrou com furiosa velocidade. Dida recebeu a bola para marcar. Vejam vocês a trama diabólica: - "Caixa Econômica" - Henrique - Dida! O Fla-Flu continuou, mas a verdade é que o tricolor estava perdido. O que desintegrou meu time não foi nem o gol, mas a intervenção sobrenatural do "Caixa Econômica". (...)

segunda-feira, janeiro 05, 2004



Sanny em Valência, com Montoya

A Fórmula-1 é o único esporte que eu gostaria de cobrir se trabalhasse na editoria de Esportes. E não é que em sua primeira viagem internacional, em dois meses de editoria, a minha amiga Sanny Bertoldo vai para Valência, na Espanha, para a apresentação do novo Williams do Juan Pablo Montoya??? É um sonho!!!
Melhor ainda será se em 2004 o colombiano finalmente acabar com a hegemonia de Schumacher, que é um grande piloto, diga-se de passagem.

Enquanto isso...

O palhaço do Rubinho diz que quer ficar na Ferrari até o fim do contrato do seu companheiro de equipe. E a escuderia italiana desmentiu uma provável prorrogação do contrato dele por dois anos. Céus, ele não merecia estar lá. Nós, brasileiros, não merecíamos passar por esse vexame chamado Rubens Barrichello.

A Joana bem que está certa: "Deus dá pérolas aos porcos"...

Olha os três malandros aí...

Pedro Paulo Malta (gravatinha cor de abóbora), Alfredo Del Penho (borboleta azul) e Pedrinho Miranda (vermelha) clicados pelo Leonardo Aversa, do Segundo Caderno do Globo.
Não estão lindos???



Neném da titia

Quatro de janeiro é uma data muito marcante. Há três anos, nesse dia, entrava eu numa sala de cirurgia, pela segunda vez, para tratar do meu pneumotórax.
Um ano depois, curada, num outro quatro de janeiro, recebia o maior presente da minha vida: meu sobrinho João Gabriel. Nem tive coragem de ir ao hospital para aguardar o parto. Mas cheguei a tempo de ver minha cunhada, Daniela, sair da sala de cirurgia com o sorriso mais feliz do mundo.
Ele era a maior criança do berçário. Quando o vi a primeira vez, estava de bruços, com o bumbum pra cima. Até nisso, ele se parece comigo. Desde que nasceu, só dorme de barriga pra baixo, como a titia. Não é por nada não, mas o garoto é a minha cara. Parece mais comigo que com o próprio pai. E não é só aparência física. Ele tem o meu jeitinho, o mesmo olhar, o jeito carinhoso e doce. Fica bravo como eu quando é contrariado.
O quatro de janeiro dos seus dois anos perdeu um pouco da graça ontem, sem o meu pequeno perto de mim. Eu cantei parabéns pra ele por telefone, ainda na esperança de que meu irmão voltasse do feriadão mais cedo. Pena. A saudade permanece até sábado, quando nos encontraremos em sua festinha na fazenda.